31/05/2010

Billy Elliot

ESPECIAL: Escrito por Cristiano Contreiras

Se há um filme mais deliciosamente cativante para a arte libertária musical cinematográfica? Billy Elliot é um trabalho primoroso da direção emocional intensa de Stephen Daldry. Tão inovador, tão simplório - o contraste faz parte da estética, tanto narrativa quanto interpretativa. É um filme centrado em dramas humanos, em valores precisos de questões verdadeiras.

A delícia da narrativa é focar num garoto de 11 anos, Billy (Jamie Bell, totalmente visceral), que, em vez de preferir lutar box, como seu pai deseja, é atraído por um grupo de dança de balé clássico, onde só há garotas. Billy tende a ter desejo em vivenciar a magia do embalo gostoso da dança, o fascínio do balé serve de alimento para a própria reflexão de sua vida e, gradualmente, um estímulo à maturidade. Billy passa a ter mais ânimo em viver e é justamente desse quadro emotivo que a película trata, magistralmente. Como dar vazão aos seus desejos? Como lidar com a vocação inabalável?

É emocionante observar o entrave do garoto, de uma cidade interiorana da Inglaterra, com um pai focado em padrões do machismo, da ignorância e do descaso paterno. Somente sua professora, Mrs. Wilkinson (a intensa Julie Walters), consegue compreender a vocação do aluno e a necessidade de dar um incentivo, visto que ele tem uma vida precária e limitada em preconceitos, bem como problemas e ausências sentimentais. Decerto, há talento promissor em Billy - há sensatez de corpo e alma à dança. Portanto, há nele uma esperança que jamais deve ser desacreditada: precisa enfrentar a contrariedade de seu irmão e de seu pai neste árduo caminho rumo à satisfação. A dança move o destino? O prazer é estar imerso nesse percurso de música, dança e amor. O roteiro, extremamente delicado, é pungente em provocar a reflexão sobre luta contra preconceitos, desejos juvenis e valores familiares. Sem fazer uma crítica agressiva social, o filme adota da linguagem dinâmica de diálogos inteligentes/emocionais - mantendo a riqueza e a musicalidade do sotaque local - com o sustento da trilha sonora riquíssima em hits de T-Rex e The Clash para fortalecer uma aproximação dos personagens com o público. A fotografia, bem cuidada, mas discreta, emoldura o norte da Inglaterra com competência.

A trama se passa nos anos 80, há um tom intenso de nostalgia. Há, ainda dentro do melodrama, valores de homossexualidade: um dos amigos de Billy gosta de vestir roupas femininas, usa maquiagem da mãe e demonstra certo desejo por ele - obviamente, tudo sem vulgaridade, com bastante sutileza. E Jamie Bell conduz seu Billy com delicadeza, ora imaturo juvenil, ora másculo rebelde decidido. A doçura narrativa, o tom intimista e a direção deliberadamente singela reproduzem o status da pura arte cinematográfica - nota-se um exercício dramático mesclado ao leve humor que reflete num pequeno grande filme. Não é um épico, mas uma peça de composição que penetra corações. Aborda a superação dos limites, com uma verve de pura beleza e poética humanitária. Eis uma lição de vida, um poema juvenil de esperança para nossa sociedade mergulhada na hipócrita severidade. Há uma quebra dos tabus sobre a orientação sexual de bailarino - visto que Billy não é homossexual, mas respeita as diferenças (seu melhor amigo gay tem seu apoio) e mostra ao pai que não só homens homossexuais se interessam por balé. Por ser heterossexual, Billy não deixa de ser imensamente sensível e ter qualidades femininas. Eis um filme sexualmente libertário. Pequena obra-prima.

2 comentários:

M. disse...

Tenho um especial carinho por este filme. Embora seja ficção, a história desse menino lutando para ser bailarino profissional, vivendo em um lar maxista me comove.

Alan Raspante disse...

Ah esse filme é muito bonito, assisti ele uma vez quando foi exibido na Globo, uma verdadeira obra-prima!
Bjs